segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Caíssa...

Caíssa...
Duas da tarde. O sol brinca de aparecer e esconder-se por entre as nuvens. Mesmo assim, em momento algum, ele se esquece de abraçar a cidade e demonstrar todo o seu afetivo calor. Na cidade, tudo normal. Trânsito louco e calçadas repletas de pessoas num vai e vem frenético. De diferente, só o tradicional ar de sexta-feira, aquele cheirinho de final de semana se aproximando.

Caíssa tem pressa, está atrasada para o trabalho. Ajeita os últimos detalhes da roupa enquanto já fecha a porta. Mas na verdade, preferiria mesmo era ficar dormindo, pois trabalhou muito no dia anterior e seu corpo pede descanso. Na verdade mesmo, ela nem queria ir para o trabalho. Vai somente porque ainda tem um ano de mensalidades de faculdade pela frente, metade de um enorme carnê de seu carro, aluguel, quatro ou cinco sapatos que ela ainda nem usou, duas bolsas que ela não sabe por qual motivo comprou e algumas outras continhas básicas que só a alma feminina compreende.

Já tem um bom tempo que Caissa se cansou do que faz. Às vezes, até imagina que era feliz, e não sabia, quando trabalhava naquela lojinha da mãe de uma amiga de infância. Todavia, Caissa tem um sonho: ela quer ser arquiteta. E não via como conseguiria pagar a alta mensalidade do curso se continuasse ganhando o que a mãe de sua amiga podia lhe pagar como salário. Caíssa sempre achou que realizar seus sonhos vale alguns sacrifícios, então seguiu. Tinha que arrumar algum emprego que pagasse bem, mesmo que fosse um trabalho duro. E conseguiu...

Caissa acelera. Os semáforos parecem não colaborar; ela então aproveita e arruma a maquiagem. Num desses semáforos da vida, ela ri quando vê que mais do que nunca seu instinto materno vem falando alto. Fica observando admirada uma família que cruza a faixa de pedestre, e sonha com o dia que poderá realizar seu desejo de ser mãe e formar uma família. Deseja ter ao seu lado um homem que a respeite como mulher, um filho para educar e dar carinho... Um buzinaço... E Caissa retorna ao mundo real. Olha o relógio e percebe que se encontra 10 minutos atrasada.

Caissa é daquele tipo de mulher que causa torcicolo. Alta, loira, corpo esculpido em aulas de dança e academia e, o que mais se destaca, é dona de olhos verdes que instigam o perigo. É também muito inteligente. Gosta de literatura. Conhece alguns poemas e adora recitá-los de cor. Tem bom gosto musical. Fala sobre política, religião e arte. Conhece as obras de um ou outro filósofo. Sabe até explicar quando um jogador encontra-se em impedimento.

Porém, mesmo com tantas qualidades, Caissa não sabe o que é amar e ser amada há um bom tempo. E ela até sabe o motivo: o trabalho toma todo seu tempo e energias. Além do que, não acredita que algum homem entenda sua opção e que ela trabalha tanto apenas para realizar um sonho cada vez mais próximo. Mas, sempre foi sabedora que tinha um preço a pagar, e resolveu seguir.

O que lhe dói pra valer, porém, é ter que ficar longe de casa e não ter o carinho dos pais. Ela sente falta do amor de mãe e do afeto do pai e de seus cinco irmãos. Mas ela sabe que tem que trabalhar duro. E o que acalenta um pouco seu peito sofrido é saber que o dinheiro que manda pra sua mãe esta ajudando a melhorar a vida de todos que ficaram naquela cidadezinha perdida num interior qualquer.

Caissa chega ao seu local de trabalho. Pega o telefone e antes de ligar pede proteção a Deus, é religiosa. Pede que seja mais um cliente gente fina e que nada de ruim lhe aconteça. Pra tomar coragem, lembra-se de seus sonhos e, também, que este é um dia a menos de trabalho, e não mais um dia. Ela liga...

- Alô?

- Oi amor! Desculpa o atraso.
- Tudo bem.
- Qual o número do seu quarto?
- 38.
- Ok. Vou apenas confirmar na recepção. Já tô chegando. Um beijo...